ACESSEM TAMBÉM NOSSO SITE:

http://ctsiufpr.intuitwebsites.com


Nele vocês encontram revisões sobre temas frequentes na prática médica, desafios diagnósticos de imagens, links úteis, atualizações médicas. Entrem e confiram!

sábado, 26 de novembro de 2011

NÃO BASTASSE A TPM...

        
        Não bastasse dismenorréia, alteração de humor, mastalgia e outros desconfortos do período pré e peri-menstrual, há uma entidade que pode acometer as mulheres durante os ciclos chamada pneumotórax catamenial. A doença consiste em pneumotórax recorrentes, geralmente desencadeado nos três primeiros dias de fluxo. Não ocorre em todo ciclo menstrual, mas quando ocorre coincide com seu início. Acomete mulheres entre os 30 e 40 anos de idade e quase que exclusivamente o tórax direito.
         
        Sua fisiopatologia não é totalmente estabelecida, porém há 2 linhas de explicação:

1) sugere-se que alguma falha no diafragma direito deixaria algum ar passar para o tórax quando no periodo menstrual houvesse a entrada de ar no abdôme pelo trato genital com a abertura do colo uterino. Essa teoria é reafirmada com relatos de pneumoperitônios espontâneos pós-partos normais e pneumotórax espontâneos pós-coito, além de resolução de casos de pneumotórax catamenial com ligadura tubária. Muitas vezes são encontradas aberturas no diafragma durante torascoscopias para investigar a ocorrência dos pneumotórax, prontamente corrigidas no procedimento.

2) presença de focos de endometriose sobre a pleura que, nos períodos de ciclagem hormonal, seriam ativados e a romperiam, levando a entrada de ar no espaço pleural. A circulação natural do líquido peritonial no sentido horário, ascendendo a goteira parieto-cólica direita explicaria a preferência desse lado do acometimento. 75% das paciente com endometriose pleural se apresentam com pneumotórax recorrente, o restante apresentando hemotórax cíclico e/ou hemoptise. 


Múltiplas perfurações em diafragma direito vistas pela vídeo-toracoscopia. Posteriormente, a histopatologia confirmou focos de endometriose no local.

       Esses dois mecanismos explicam somente 40% dos casos, ficando o restante inexplicado mesmo após exploração vídeo-cirúrgica.
       Após avaliação por toracoscopia, aberturas no diafragma são corrigidas e focos de endometriose ressecados. Caso haja recorrência, está indicada supressão hormonal, mesmo sem evidência de endometriose, ou pleurectomia.


J Thorac Cardiovasc Surg 2004;128:502-8
JSLS (2003)7:371-375
Pneumonol. Alergol. Pol. 2011; 79, 5: 347–350
International Pleural Newsletter Volume 1 Issue 1 January 2003

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

A VARFARINA TENTANDO RESISTIR AOS NOVOS ANTICOAGULANTES


        Somente esse ano, duas novas drogas foram aprovadas pelo FDA para a prevenção de eventos tromboembólicos em paciente com fibrilação atrial: a dabigatrana e a rivaroxabana. Além deles, a apixabana está em estudos e provavelmente também seja aprovada em breve. A principal vantagem dessas novas drogas é que dispensam controle de alvo laboratorial de anticoagulação, diferentemente da varfarina e suas medidas frequentes de RNI. Quando comparadas a enoxaparina para prevenção de trombose venosa profunda e tromboembolismo pulmonar, destacam-se pela administração oral.

        Segue um breve resumo das características dessas drogas. Ainda não há estudos comparando a dabigatrana com a rivaroxabana ou o apixaban.        

Nome
Dabigatrana
Nome comercial
Pradaxa®
Posologia
150 mg 2x/dia
Via de administração
Oral
Mecanismo de ação
Inibidor direto da trombina (fator IIa)
Estudo clínico
RE-LY
Indicação (aprovada pelo FDA)
Prevenção de eventos tromboembólicos em paciente com fibrilação atrial não-valvar
Custo médio (30 dias)
R$ 600,00
Bula
http://www.pradaxa.com/

Nome
Rivaroxabana
Nome comercial
Xarelto®


Posologia
10 mg 1x/dia
- 12 dias – prótese de joelho
- 35 dias – prótese de quadril

20 mg 1x/dia
- contínuo para paciente com fibrilação atrial não-valvar
Via de administração
Oral
Mecanismo de ação
Inibidor do fator Xa
Estudo clínico
ROCKET AF

Indicações (aprovadas pelo FDA)
- prevenção de trombose venosa de profunda e tromboembolismo pulmonar em pós-operatório de prótese de joelho e quadril

- prevenção de eventos tromboembólicos em paciente com fibrilação atrial não-valvar
Custo médio (30 dias)
R$ 700,00 (10 mg)
Bula
Http://www.xareltohcp.com

Nome
Apixaban
Nome comercial
Eliquis®
Posologia
2,5 mg 2x/dia
- 10-14 dias – prótese de joelho
- 35 dias – prótese de quadril

5 mg 2x/dia
- contínuo para paciente com fibrilação atrial não-valvar
Via de administração
Oral
Mecanismo de ação
Inibidor do fator Xa
Estudo clínico
ARISTOTLE

Indicações
(AINDA NÃO APROVADAS PELO FDA)
- prevenção de trombose venosa de profunda e tromboembolismo pulmonar em pós-operatório de prótese de joelho e quadril

- prevenção de eventos tromboembólicos em paciente com fibrilação atrial não-valvar


Locais de ação das respectivas drogas. 1) Varfarina: inibe a produção hepática dos fatores II, VII, IX e X, além das proteínas C e S, aqui não representadas. 2) Rivaroxabana: antagonista do fator Xa. 3) Apixaban: antagonista do fator Xa. 4) Dabigatrana: inibidor do fator IIa - trombina.

        A varfarina não se dá por vencida. Em recente guideline da American Heart Association, publicado na revista Circulation, no qual já se incluiu a dabigatrana como alternativa para anticoagulação de pacientes com fibrilação atrial não-valvar, a varfarina mantém-se como primeira opção, além de ser recomendada sua manutenção em paciente com bom controle de RNI e sem eventos adversos. Já no Annals of Internal Medicine, um novo estudo mostrou que pacientes com RNI estáveis por pelo menos 6 meses podem ter seu índice reaferido em 3 meses, o que diminui os custos. Parece que ainda há pessoas que acreditam na varfarina e ela deve permanecer entre nós por um bom tempo apesar das promissoras novas opções.



N Engl J Med 2011 Aug 10
N Engl J Med 2011; 365:981-992
Annals of Internal Medicine 15 November 2011 155(10): 714-716
http://www.fda.gov/NewsEvents/Newsroom/PressAnnouncements/ucm278646.htm

domingo, 13 de novembro de 2011

POR QUE PESSOAS COM HIPOTERMIA GRAVE TIRAM A ROUPA?


         
        A hipotermia é importante causa de morte em países de clima frio. Acomete mais pacientes idosos, portadores de transtornos mentais e moradores de rua. Substâncias depressoras do SNC têm importante papel no desenvolvimento da hipotermina e seu desfecho, principalmente álcool e benzodiazepínicos, já que rebaixados têm menor ímpeto de evitar a perda de calor e podem ficar expostos por longos períodos ao meio.

         Existem 3 respostas básicas à diminuição da temperatura corporal: a busca de abrigo, vestes, locais aquecidos; o tremor; e o aumento da produção endógena de calor. Esse terceiro item é mais evidente em lactentes, que têm a gordura marrom, rica em mitocôndrias e com capacidade de aumentar em até 3 vezes o metabolismo basal da criança. Já o adulto, com todos os componentes da resposta, pode ter um aumento de até 10 vezes.         
Todas essas respostas, principalmente o comportamento de buscar calor, parecem-nos óbvias e lógicas. Entretanto, em indivíduos com hipotermia moderada (30-34ºC) a grave (<30ºC), pode ocorrer o contrário: estando com a temperatura corporal diminuída, o paciente retira suas roupas. É o chamado paradoxical undressing (“despir paradoxal”), ocorrendo em até 25% dos casos de óbito por hipotermia. Logo, os corpos são encontrados completamente ou semi-nus, com as vestes dispostas em “trilha” até o local onde o indivíduo foi encontrado sem vida. Geralmente, a pessoa inicia a retirada da roupa pela parte de baixo, sem motivo óbvio para tal. A principal hipótese para explicar tal fenômeno é que após a vasoconstrição inicial em resposta à baixa temperatura, ocorre lesão dos nervi vasorum pelo frio intenso, culminando em vasodilatação por vasoplegia das artérias que suprem a pele, dando a sensação de calor à pessoa. Já torporosa pela hipotermia, irracionalmente ela retira as vestes, aumentando ainda mais a perda de calor.
Outro comportamento interessante em pacientes com hipotermia é o de se abrigar em locais estreitos, numa atitude primitiva de se proteger (terminal burrowing behaviour, hide-and-die syndrome). Exemplos típicos são embaixo de camas, atrás de armários, em depressões ou buracos no solo, embaixo de bancos de praças ou atrás de arbustos, esses três últimos quando em campo aberto. Muitos dos locais  são de difícil acesso, onde os indivíduos conseguem chegar rastejando. Como geralmente esse reflexo ocorre após o paciente ter se despido, é comum encontrar escoriações em joelhos, cotovelos, dorso de pés e face. Diferentemente de outras causas de morte, é típico esses pacientes serem encontrados em decúbito ventral, com os membros inferiores extendidos e os superiores flexionados sobre o tórax, numa atitute de rastejar. Uma segunda forma comum é a posição fetal. Discute-se se a procura desses locais para se abrigar seria uma tentativa de se aquecer ou um reflexo primitivo de se esconder e se proteger de predadores enquanto com o metabolismo diminuído, como nos animais que hibernam.
O que pensar de uma pessoa encontrada nua num ambiente frio, em decúbito dorsal e com escoriações, além de encravado em algum canto estreito? Imediatamente, remete-se a uma pessoa violentada, principalmente se mulher, e a tentativa de se esconder o corpo! Todas essas características próprias do paciente em hipotermia grave e o ambiente no qual ele é encontrado orientam tanto os socorristas quanto os policiais e os legistas, caso encontrado morto, de não obrigatoriamente se tratar de um crime, mas uma série de comportamentos primitivos e patológicos desencadeados pela hipotermia no organismo humano.
J Forensic Sci, Jul. 1979, Vol. 24, No. 3
Int J Leg Med (1995) 107 : 250-256

          

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

RITMO CHOCÁVEL: FAVOR NÃO CHOCAR!!!

 

          A intoxicação digitálica pode cursar com qualquer tipo de arritmia. Em linhas gerais, pode-se dizer que os digitálicos aumentam a automaticidade e excitabilidade das fibras musculares cardíacas, tendendo a extra-sístoles e taquidisritmias. Além desse efeito, diminuem a velocidade de condução, tanto ventricular quanto nodal, cursando com aumento do intervalo PR e alargamento do complexo QRS. Como morfologicamente a intoxicação digitálica pode cursar com qualquer padrão eletrocardiográfico, suspeitar sempre que houver aumento de automaticidade e lentificação da velocidade de condução. A apresentação mais comum é um bloqueio atrio-ventricular (AV) de grau variado, associado a aumento da automaticidade ventricular, ocorrendo em até 40% dos paciente com intoxicação digitálica reconhecida. Esses pacientes tendem a fazer mais arritmias ventriculares, inclusive fibrilação ventricular. Taquicardia ventricular bidirecional, apesar de não-patognomônico, é muito sugestiva de intoxicação digitálica grave.
 
Taquicardia Ventricular Bidirecional - o eixo do QRS alterna sua direção no plano frontal, hora para direita hora para esquerda. Característico de intoxicação digitálica.
       Em pacientes com arritmias cardíacas graves por intoxicação digitálica, deve-se evitar sempre que possível a cardioversão elétrica. O digital sensibiliza o miocárdio e o choque elétrico pode disparar mais arritmias ventriculares, culminando com fibrilação ventricular. Caso a cardioversão seja realmente necessária por uma situação de risco de morte, lidocaína profilática deve ser administrada antes e ser usada a menor energia indicada para a arritmia. Se houver hipocalemia, esta deve ser corrigida antes da cardioversão.

       Outro ritmo "chocável" que não deve ser chocado é o padrão sinusoidal próprio da hipercalemia grave, que pode ser facilmente confundido com uma taquicardia ventricular monomórfica.

 
Hipercalemia Grave com Padrão Sinusoidal - aumento de ondas T, alargamento de QRS e achatamento de onda P.


Taquicardia Ventricular Monomórfica

Diagn Tratamento. 2011;16(2):84-5.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

CORREÇÃO DO SÓDIO SÉRICO PELA GLICEMIA EM DISCUSSÃO


       Em 1949, foi descrito pela primeira vez o efeito da hiperglicemia sobre a natremia. Seldin et al descreveram o efeito osmótico da glicose em excesso dentro do vaso, trazendo consigo água do interstício e de dentro das células para tentar equilibrar a osmolaridade e, assim, diluindo o sódio intra-vascular.

       Classicamente, conhecemos o fator de correção de - 1,6mEq/L de Na+ para cada +100 mg/dl de glicose além de 100 mg/ml de glicemia, mas já houve propostas de outros valores desse fator, variando de 1,2 a 2,8mEq/L de Na+. Os estudos que determinaram esse valores sempre foram teóricos, baseados na capacidade osmótica tanto da glicose quanto do sódio.

       Em 1999, um artigo publicado no American Journal of Medicine avaliou empiricamente os valores do sódio sérico com a variação da glicemia. Em voluntários saudáveis foi infundida somatostatina (que inibiria a secreção endógena de insulina) e uma solução de glicose a 20% até que os níveis de glicemia chegassem a 600 mg/dl. Após, com a infusão venosa de insulina regular, baixou-se a glicemia para níveis normais (até 140). Durante todo o processo, o sódio sérico foi medido a intervalos regulares e, posteriormente, comparado com a glicemia.

       O estudo certificou que para glicemias de até 400 mg/dl, o fator 1,6 se correlacionou bem com a variação da natremia, porém para valores acima de 400 mg/dl, melhor seria um fator de correção do sódio de 4,0. Tentando juntar essa variação para facilitar o uso à beira do leito, o estudo encontrou o valor final de -2,4 mEq/L de Na+ para cada +100mEq/L acima de 100 mg/dl de glicemia, em qualquer magnitude.

         Se 12 anos após esse estudo, que não pareceu revolucionário nem ecoou nas revistas médicas, continuamos a usar o fator de 1,6 para correção e parece dar certo, isso não traz muitas mudanças. Mas considerando que a variação do sódio plasmático é uma situação delicada, sempre lembrando da mielinólise osmótica possível, vale a dica.

Am J Med. 1999;106(4):399-403.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

PROTEÍNA C ATIVADA RECOMBINANTE (XIGRIS) RETIRADA DO MERCADO

        
       Depois de aproximadamente 30 anos sem novidades na área de tratamento específico da sepse, em 2001 surgiu a proteína C ativada recombinante, a alfa-drotrecogina ativada (Xigris), promessa de sucesso no tratamento dessa síndrome clínica.
        A proteína C é componente inato do sistema de anticoagulação endógeno, tendo atividade fibrinolítica e antitrombótica, além de atuar como anti-inflamatório. O estado pró-inflamatório e pró-trombótico próprio da sepse inibe a formação da proteína C a partir de seus precursores, estando em níveis diminuídos nesses casos. Diante desse contexto, pensou-se que repondo a proteína poderia-se frear em parte a cascata inflamatória da sepse, melhorando o desfecho dos pacientes.
        Conforme sua validação no estudo PROWESS e aprovação pelo FDA, em novembro de 2001, a alfa-drotrecogina ativada ficou indicada em pacientes adultos (>18 anos) com sepse grave e alto risco de morte conforme o APACHE II (>25 e/ou disfunção de múltiplos órgãos). O risco de sangramento sempre foi a complicação mais temida em pacientes com condições predisponentes, cirurgias recentes ou drogas anticoagulantes de uso concomitante.
          Na sequência dos estudos, a alfa-drotrecogina ativada mostrou-se inefetiva no tratamento de sepse em crianças. Em 2007, novo estudo foi delineado para verificar sua utilidade em adultos com sepse grave e menor risco de morte (APACHE II < 25 e/ou disfunção isolada de órgão), mostrando-se ineficaz comparada ao placebo. Em todos os novos estudos e revisões, sempre ficou em lugar de destaque o risco de sangramento significativo que a droga trazia aos pacientes comparado ao benefício. Desde seus primeiros estudos, o risco de sangramento significativo chamou a atenção como grande efeito colateral da droga.
        Em 25 de outubro desse ano, a empresa responsável pela fabricação da medicação decidiu por suspender a fabricação e proscrever seu uso após resultados desfavoráveis do estudo PROWESS-SHOCK, em que o uso da alfa-drotrecogina não mostrou diminuição de mortalidade comparado ao placebo em indivíduos com choque séptico.
        Após uma curta e polêmica existência, resultados duvidosos e grande receio de sangramento com seu uso, a esperança de tratamento específico do estado inflamatório da sepse é adiada.

http://www.fda.gov/Safety/MedWatch/SafetyInformation/SafetyAlertsforHumanMedicalProducts ucm277143.htm
N Engl J Med 2001 Mar 8 344 699-709
N Engl J Med 2005 Sep 29; 353:1332-41