Ao ouvirmos a expressão "encefalopatia de Wernicke", pensamos imediatamente em pacientes alcoolistas crônicos, desnutridos, repondo glicose endovenosa sem reposição de tiamina e desenvolvendo a tríade confusão mental, ataxia e oftalmoplegia. Realmente, essa é a situação mais comum em que a entidade clínica se apresenta, porém, sabendo que é a utilização de carboidratos ofertados a um organismo deficiente em tiamina (vitamina B1) a base para o desenvolvimento da síndrome, deduz-se que possa ocorrer em outros contextos.
A tiamina é um co-fator essencial para o metabolismo de carboidratos, participando de diversas etapas da oxidação da glicose no ciclo de Krebs. Sem essa vitamina, o processo fica comprometido, levando à respiração anaeróbia e produção de ácido lático.
Certas áreas cerebrais com grande demanda metabólica e elevado uso de tiamina são as primeiras a sofrer, evoluindo com morte celular e as manifestações clínicas típicas da encefalopatia de Wernicke.
A partir desse entendimento, citamos outras situações em que a encefalopatia por deficiência de tiamina pode se desenvolver:
- Alcoolismo: o etilista tem seus estoques de tiamina diminuídos tanto pela desnutrição quanto por interferência na absorção intestinal da vitamina provocada pelo álcool.
- Hiperêmese gravídica: a gestante tem maior necessidade diária de ingestão de tiamina. Em uma paciente com vômitos frequentes e que não consiga se alimentar adequadamente, os estoques corporais de tiamina podem se esgotar em até 3 semanas.
- Cirurgia bariátrica: após o procedimento, o paciente diminui radicalmente a quantidade de alimentos ingeridos. Se não forem adequadamente repostas as vitaminas essenciais, pode-se desenvolver a síndrome por esgotamento das reservas de tiamina.
- Síndrome de realimentação: após a realimentação, oral ou endovenosa, de pacientes em longos períodos de jejum, há uma ávida captação de eletrólitos e vitaminas pelas células, a partir da corrente sanguínea e estoque corporais. Nesse contexto, os estoques de tiamina podem ser depletados pelas células periféricas, comprometendo o aporte da vitamina para o cérebro.
- Outras doenças crônicas (AIDS, tuberculose disseminada, neoplasias) ou síndromes disabssortivas.
A reposição de glicose endovenosa diante um déficit corpóreo de tiamina pode desencadear a síndrome, porém ela geralmente ocorre em reposições mais prolongadas. Na suspeita, deve-se repor vitamina B1 juntamente com a glicose, porém em emergências, como hipoglicemia severa, não se deve adiar a correção da glicemia se não se têm facilmente disponível tiamina.
Diante da severidade do quadro quando estabelecido e da facilidade de se evitar, deve-se pensar na prevenção da encefalopatia de Wernicke de maneira simples: pensou na possibilidade, trate: reponha tiamina!
OPINIÃO DO ESPECIALISTA
"A encefalopatia de Wernicke é caracterizada pela presença de uma tríade de sintomas, com oftalmoplegia, ataxia de marcha e confusão mental e está relacionada com a deficiência de tiamina no SNC. Geralmente está associada com abuso de álcool, mas outras condições clínicas também são encontradas, como a presença de desnutrição, gestação, vômitos incoercíveis, pacientes com SIDA, insuficiência renal crônica, etc. Aqui no HC da UFPR foram descritos casos de EW em pacientes do serviço de TMO, inicialmente, decorrentes de iatrogenese (Bleggi-Torres et al. Bone Marrow Transplant 1997; 20: 391-395), mas depois também em pacientes que estavam em reposição de tiamina por via oral preventiva. Especulou-se se o uso de bussulfan no regime de condicionamento para o TMO poderia induzir ao aparecimento de EW (Teive et al. Arq neuropsiquiatr 2008; 66: 685-590).
Dr. Hélio Teive
Chefe do Serviço de Neurologia e Professor Adjunto de Medicina Interna (Neurologia) da UFPR
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ResponderExcluirJuro que não faço idéia como e pra que ser isso. Sugestão?
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